Por Rita Andrade*
por que precisamos falar de cultura? porque estamos vivos! porque esse mundo é tão meu quanto seu e, embora digam que ele tem um dono, ele não tem um dono, ele é uma responsabilidade minha, sua, nossa. dizer que ele tem um dono é mais uma falácia para desmobilizar, é um investimento na destruição de um dos traços marcantes da nossa cultura, a alegria!
em tempos de estímulo a queimadas na amazônia, de destroços assombrosos de brumadinho, de cocôs, dia sim, dia não, de bozo e adão, precisamos falar, sim, de cultura, da nossa cultura, dos fazeres artísticos, das rendas, dos bordados, dos tijolos e dos cacos de cerâmica, dos últimos barracos, das vilas, das batalhas de rap, do funk e punk, dos muitos são joãos, dos despachos que fazemos e desfazemos aqui nesse quadradinho.
uma verdade é que somos feitos de gentes de todos os cantos e aqui temos um pouco de todos, isso gera uma cultura pulsante que se faz presente nos palcos cada vez mais silenciados, na música calada, na poesia e seus levantes, nos grafites nos cantos da cidade, nas danças com batuques moucos, no samba sem avenida, no cinema sem ingresso para entrar no festival… é por isso que precisamos falar de cultura, da cultura que fazemos e em que acreditamos, que é atacada pelos que têm medo das nossas cores, das nossas vozes, nossos ritmos e nossos movimentos.
e quando falamos dessa bendita cultura, falamos dos cheiros, dos saberes e dos sabores, da opressão, dos guetos, das panelas – ah como tem panelas na nossa cultura: panelas no centro e nas periferias! – , de estilos e tribais, panelas onde fazemos nosso arroz com feijão temperado com agrotóxicos e fazemos nossos conchavos. aliás, não podemos mesmo falar da nossa cultura sem citar as panelas nas janelas, no fogão e na cabeça. viva o menino maluquinho que mora em mim e mora em você, viva os nossos malucos da cultura os que lutam, criam, xingam, sofrem, sorriem, escrevem projetos e projetos e ganham FAC!!!!
e não dá para falar de cultura candanga, brasiliense, distrital e tal, sem falar de FAC, LOC, LIC, direitos e deveres, conselhos, prestações de conta. isso porque cultura no DF é lei! por tudo isso e muito mais, precisamos sentar debaixo de um ipê amarelo ou de um pé de manga, colocar nossos celulares no bolso, olhar nos olhos e falar sobre a nossa cultura, depois publicamos a foto na rede!
não basta estarmos no terceiro lugar em produção cultural no ‘brezil’, não basta sermos eruditos, populares, nem tradicionais, não basta ser a capital do rock e tocar xote, baião, xaxado, fazermos chorinho como ninguém. não basta o circo ser moderno, dulcina sair da UTI, se não lutarmos pelo diacho dessa cultura. continuamos vendo nossos teatros fechados, os espaços sucateados, os artistas sendo criminalizados, os cinemas evangelizados, a arte confinada no setor comercial sul, a arte que não tem mais parte e que segue com os ventos fracos que ainda sopram do passado recente. precisamos falar sobre a nossa cultura, porque estamos vivos e respirando, seguimos de pé e em movimento!
*Rita Andrade é Diretora de Produção e Coordenadora de Departamentos e Equipes em promoção de eventos culturais e projetos de audiovisual, Artista Educadora, graduada em Artes Cênicas, Conselheira de Cultura do DF e ativista do movimento em defesa da cultura.
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