O ensino do cinema nas universidades públicas do Brasil

No dia 4 de outubro, a cineasta Érika Bauer, uma das homenageadas do Festival Taguatinga de Cinema de 2019, participa de um debate promovido por nós, em parceria com IFB do Recanto das Emas, sobre o ensino do cinema nas universidades públicas. Nesta entrevista, Érika, que é também professora de Roteiro e História do Cinema da Faculdade de Comunicação Social da UnB, traça um breve painel sobre o assunto. 

Qual é o panorama do ensino do cinema nas universidades públicas brasileiras? Se eu fosse responder a esta pergunta há dois anos, diria que não estávamos mal, pois o número de cursos de audiovisual nas universidades públicas cresceu bastante, o que se refletiu inclusive no nosso festival de cinema universitário e em tantos outros festivais. A liberdade de expressão e a diversidade impulsionaram um intensa e potente produção, levando aos festivais filmes que refletem a forte presença da cultura das mais diferentes regiões. Inventivos, engraçados, muitas vezes também densos, tristes, os filmes universitários carregam a força de uma juventude que pensa e recria o país. Lembrando também que grande parte dos cineastas que hoje reinventam o cinema no Brasil veio das universidades públicas.

De que a maneira as transformações por que passaram as universidades públicas nos últimos anos, com sua popularização e mobilidade, impactaram os cursos de cinema? Houve um aumento incrível da procura por cursos de audiovisual. As transformações pelas quais as universidades públicas passaram, trouxeram uma verdadeira chuva de esperança na produção universitária. O olhar mudou, e o sistema de cotas reajustou uma longa e injusta história de exclusão. Nasceram a partir daí filmes de periferia com novos olhares, de quem lá vive, mudando o discurso e a reflexão. A autoestima é uma construção, e depois de 15 anos da democratização das universidades públicas,  podemos dizer que suas sementes já começaram a frutificar. 

No curso de Audiovisual da Faculdade de Comunicação da UnB, há incentivo ao trabalho coletivo com a utilização de recursos mínimos, como perspectiva apresentada aos alunos para a produção profissional de filmes? Sim. Existe uma verba mínima para o estímulo da produção coletiva, que acontece durante o 7o semestre, durante a disciplina “Realização audiovisual Bloco II”. Eles aprendem que o trabalho coletivo é fundamental, que a participação de cada um na construção da obra é que vai dar sentido ao filme. A partir de um roteiro escrito em sala de aula e votado democraticamente, os estudantes aprendem o valor do trabalho coletivo em audiovisual.

Você destacaria alguma peculiaridade do curso de Audiovisual e/ou do corpo de professores de cinema da UnB? Preocupação com a formação do espírito crítico e coletivo, da cultura ampla e sempre voltada para o conhecimento do Brasil e seu cinema, além da experimentação. Também trabalhamos com as particularidades de cada estudante, dando-lhe os instrumentos necessários para o seu desenvolvimento,  que será desenvolvido nos projetos de final de curso. 

Com a proliferação de cursos de cinema no Brasil, como parte de uma tendência mundial, a pergunta que surge é se há uma indústria forte capaz de absorver os formandos. Para surgir um indústria forte, é preciso investimento e uma ampla formação do olhar do povo brasileiro, a partir da valorização da educação, sobretudo para absorver a riqueza do cinema que o país está fazendo. Sem isso, nossa indústria não se estabelecerá, serão apenas lampejos otimistas. Mas sobreviveremos,  pois continuaremos realizando nossos filmes. Depois que os estudantes conquistam sua formação profissional e acrescentam mais consciência a seu imaginário, não há como detê-los Sempre haverá alguém criando, escrevendo, gravando seu grito, seu poema, seu amor à vida. Principalmente com os crescentes avanços tecnológicos, com os aparelhos celulares cada vez mais adaptados para o audiovisual, prontos para registrarem os movimentos do mundo e novas histórias.